️ 14: O Valor de Programas Genômicos em Larga Escala — Benefícios e Desafios para a Sociedade

️ 14: O Valor de Programas Genômicos em Larga Escala — Benefícios e Desafios para a Sociedade
Base por Base
️ 14: O Valor de Programas Genômicos em Larga Escala — Benefícios e Desafios para a Sociedade

Jul 09 2025 | 00:11:10

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Episode 14 July 09, 2025 00:11:10

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Gustavo Barra Gabriela Barra

Show Notes

Episódio 14: O Valor de Programas Genômicos em Larga Escala — Benefícios e Desafios para a Sociedade

Neste episódio do Base por Base, exploramos as conclusões do relatório Meeting Report de Horn et al. (2025) no European Journal of Human Genetics, que avalia o valor prático de grandes programas genômicos nacionais em cinco níveis distintos — societal, econômico, clínico, científico e populacional — e apresenta critérios para maximizar seus benefícios e minimizar riscos.

Principais destaques: O workshop definiu valor como benefícios tangíveis em diferentes esferas, ressaltando que a confiança pública e a governança transparente são fundamentais para garantir adesão cidadã e mitigar preocupações sobre privacidade e parcerias público-privadas; apontou a carência de avaliações econômicas robustas, defendendo a criação de frameworks de custo-efetividade para embasar decisões de alocação de recursos; evidenciou potenciais ganhos clínicos ao aprimorar diagnósticos e tratamentos personalizados, mas alertou para incertezas que exigem estudos longitudinais; enfatizou a importância de Boards multidisciplinares e estruturas científicas claras para interpretar achados genômicos e evitar promessas exageradas; e chamou atenção para o risco de aprofundar desigualdades, recomendando estratégias de inclusão, engajamento comunitário e co-design para assegurar retorno equitativo.

Conclusão: O encontro concluiu que programas genômicos em larga escala representam uma nova fronteira para medicina personalizada e saúde pública, mas dependem de avaliações multidimensionais, comunicação transparente e políticas de equidade para que seus benefícios alcancem toda a sociedade de forma justa.

Referência:
Horn R., Kerasidou A., Merchant J. et al. The value of large-scale programmes in human genomics. European Journal of Human Genetics (2025). https://doi.org/10.1038/s41431-025-01844-7

Licença:
Este episódio é baseado em um artigo de acesso aberto publicado sob a licença Creative Commons Attribution 4.0 International (CC BY 4.0) – https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/

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Episode Transcript

[00:00:14] Speaker A: Bem-vindo ao Base por Base, o podcast que leva descobertas genômicas aonde você estiver. Olha, hoje a gente vai falar de um assunto que está na boca do povo, pelo menos no mundo da ciência e da saúde, os grandes programas genômicos nacionais. Governos investindo pesado, sabe? Mapeando o DNA de muita gente. A promessa é gigante, né? Revolucionar a medicina, achar cura pra doença, até turbinar a economia. Parece coisa de filme. Mas assim, saindo um pouco do hype, do entusiasmo, qual o valor real que esses projetos enormes estão entregando pra sociedade? Será que já tá acontecendo essa revolução ou a gente ainda tá mais na promessa? É isso que a gente vai investigar hoje. [00:00:57] Speaker B: Exato. E para guiar nossa conversa, a gente se baseia num trabalho bem importante, que veio das discussões do consórcio UKFRD plus DINI. DINI é a sigla para Rede de Genética e Ética. Eles juntaram pessoal fera, especialistas internacionais, para analisar justamente isso, o valor real desses programas genômicos gigantescos. O artigo saiu no European Journal of Human Genetics, liderado por Ruth Horn e colegas. [00:01:27] Speaker A: Já tem programa grande rodando por aí, né? Tipo o Genomics England, lá no Reino Unido. [00:01:31] Speaker B: Sim, tem o da França também, o Plano França Medicina Genômica 2025 e o Genome DE na Alemanha. Todos nessa linha de sequenciar muitos, muitos genomas. [00:01:41] Speaker A: O objetivo declarado é sempre esse, usar essa mantanha de dados, o tal do Big Data genômico, para melhorar a saúde e para inovar. [00:01:49] Speaker B: Certo, só que como esse consórcio apontou, faltava mesmo uma análise mais, digamos, pé no chão, sobre os benefícios concretos, sabe? O que a sociedade ganha de verdade com isso, já que é dinheiro público e dados dos cidadãos que estão em jogo. [00:02:05] Speaker A: E como eles fizeram essa análise? Não foi um estudo clínico tradicional, imagino? [00:02:10] Speaker B: Não, não. A metodologia, digamos assim, foi um workshop internacional. Eles reuniram gente de várias áreas mesmo. Eticistas, cientistas sociais, geneticistas, médicos, gente que faz política pública de vários países da Europa. [00:02:26] Speaker A: Ah, interessante. Então foi um debate crítico olhando para o que já se observa na prática, né? Menos promessa, mais realidade. [00:02:35] Speaker B: Exatamente isso. E eles olharam por vários ângulos. O social, o econômico, o clínico, o científico e o populacional. [00:02:44] Speaker A: Vamos começar pelo social, então? O que surgiu aí? [00:02:47] Speaker B: Bom, um ponto chave é a confiança do público. Ela é essencial, mas ao mesmo tempo super frágil. Especialmente quando entram parcerias com empresas privadas. Aí já acende um alerta sobre privacidade, uso dos dados. [00:03:02] Speaker A: Faz sentido. [00:03:02] Speaker B: E tem outro risco, o de superestimar o poder da genética, principalmente em doenças comuns. A gente sabe que nessas doenças, fatores como estilo de vida, ambiente, contam muito, né? [00:03:14] Speaker A: Sim, claro. [00:03:15] Speaker B: Corremos o risco de cair no determinismo genético, achar que está tudo escrito no gene. Isso pode acabar desviando atenção e dinheiro de outras áreas da saúde que são super importantes. [00:03:26] Speaker A: Tem algum exemplo que eles discutiram? [00:03:28] Speaker B: Sim, falaram do Generation Study, lá na Inglaterra. É um projeto para fazer triagem genômica em recém-nascidos. A ideia é ótima, detectar doenças raras cedinho. Mas... levanta um monte de questões éticas. Consentimento dos pais para algo que vai impactar a vida toda da criança. O custo de ficar vigiando por causa de previsões que às vezes são incertas. [00:03:52] Speaker A: E a toda penetrância, né, que você mencionou. [00:03:55] Speaker B: Exato. A penetrância. Nem todo mundo que tem a variante genética vai desenvolver a doença. Fora de um contexto de suspeita clínica, o que aquele achado realmente significa é complicado. [00:04:06] Speaker A: Entendi. E a parte econômica. Porque, nossa, esses programas devem custar uma fortuna. O retorno financeiro, o valor para a sociedade, compensa o investimento? [00:04:15] Speaker B: Olha, aí é que está um dos nós mais difíceis de desatar. Fazer uma avaliação de custo-benefício que seja realmente completa para esses programas é um desafio enorme. E, a verdade, a evidência que a gente tem hoje é muito limitada. Falta avaliar o valor econômico geral do programa, sabe? Não só uma aplicaçãozinha aqui e outra ali. [00:04:38] Speaker A: E por que é tão difícil? [00:04:39] Speaker B: A experiência da Dinamarca que foi citada mostra um pouco. A própria estrutura do sistema de saúde pode dificultar. Falta recurso específico para fazer essa análise econômica robusta. Não é simples. [00:04:50] Speaker A: Certo. Mudando para o lado clínico, para quem está na ponta, médicos e pacientes. Quais são os ganhos e as dificuldades que aparecem? [00:04:59] Speaker B: Para doenças raras, os benefícios são mais claros. Sim, a gente vê diagnósticos que antes demoravam anos, às vezes décadas. Isso abre portas para tratamentos mais direcionados, ajuda no planejamento familiar. É um avanço real. [00:05:12] Speaker A: Isso é ótimo. [00:05:13] Speaker B: É ótimo. Mas atenção, não é uma garantia para todo mundo. No projeto dos 100 mil genomas do Reino Unido, por exemplo, que foi um marco, só cerca de 25% dos participantes com doenças raras conseguiram um diagnóstico molecular provável. [00:05:31] Speaker A: Só 25%. Isso é um ponto importante, porque a expectativa de quem entra num programa desses deve ser alta, né? De finalmente ter uma resposta. [00:05:40] Speaker B: Exatamente. Lidar com essa incerteza, com a esperança e às vezes com a frustração, isso é crucial, tanto para os pacientes quanto para os médicos. Existe o que eles chamam de incerteza funcional. O que fazer com um achado genético cujo significado clínico não é totalmente claro? Isso pode levar a decisões médicas que talvez não sejam o melhor para aquele paciente específico naquele momento. [00:06:08] Speaker A: Complicado. E, cientificamente, além do diagnóstico de raras, aqueles scores de risco poligênico, que prometem prever risco para doenças comuns, tipo diabetes, doença cardíaca, funcionam bem na prática? [00:06:23] Speaker B: Esses scores que a gente ouve falar pela sigla em inglês PRS, Polygynic Risk Scores, tem limitações bem importantes. Eles só conseguem capturar uma parte do risco genético total para essas doenças complexas. E o principal, eles não levam em conta os fatores ambientais, estilo de vida, que a gente sabe que pesam muito. Então podem criar uma falsa sensação de segurança em quem tem score baixo ou gerar ansiedade e exames desnecessários em quem tem score alto. É o risco do sobrediagnóstico. [00:06:54] Speaker A: E na oncologia, que se fala tanto de medicina de precisão? [00:06:58] Speaker B: Na oncologia de precisão, o sequenciamento genético do tumor ajuda muito a guiar tratamentos, sem dúvida. Mas a interpretação dos achados ainda é complexa. Precisa de sistemas de avaliação bem rigorosos, tipo o que a Sociedade Europeia de Oncologia Médica, a ESMO, propõe, para saber o que aquele achado genético realmente significa para a decisão terapêutica. [00:07:21] Speaker A: Ok. E agora pensando na escala maior, na população inteira. A tal saúde pública de precisão usando genômica para prevenir doenças em larga escala. Esse é pra já? [00:07:33] Speaker B: A ideia é muito atraente, mas a implementação tem vários desafios. Como é que a gente traduz um achado individual de risco genético para uma estratégia que funcione para a população toda e seja eficaz? Sinceramente, ainda falta muita evidência de que isso realmente melhora os resultados de saúde pública de forma geral e tem um risco sério que a gente não pode ignorar. O de aumentar as desigualdades em saúde, a gente sabe que grupos que já são marginalizados por N motivos tendem a participar menos dessas pesquisas e consequentemente se beneficiar menos das tecnologias que surjam. E tem uma tensão aí, né, entre o objetivo de melhorar a saúde e os motores econômicos e científicos que também empurram esses programas pra frente. Nem sempre os interesses alinham perfeitamente. [00:08:28] Speaker A: Então, pelo que você está dizendo, a conclusão geral desse pessoal do consórcio é que a gente precisa de mais. Calma. Mais análise antes de sair implementando tudo em massa. [00:08:38] Speaker B: Basicamente, é por aí. A avaliação do valor real desses programas ainda é muito insuficiente. Falta rigor, especialmente na análise econômica antes de jogar rios de dinheiro público nisso. Dinheiro que talvez fizesse mais diferença em outras áreas da saúde com benefícios já comprovados. [00:08:58] Speaker A: E quais seriam as recomendações práticas deles? [00:09:01] Speaker B: São várias, mas dá para resumir? Primeiro, comunicar de forma realista, sem promessas exageradas sobre o poder da genômica. Segundo, gerar evidência econômica robusta, para ontem. Terceiro, entender melhor as experiências reais de pacientes e médicos com essa incerteza toda. Quarto, implementar os programas com cautela, sabe, baseado em evidência, talvez começando por grupos onde o benefício é mais claro. Quinto, reconhecer e abordar as tensões entre os diferentes objetivos, saúde, economia, ciência. E por último, mas talvez o mais crucial, trabalhar ativamente para reduzir as desigualdades em saúde que a genômica pode, sem querer, acabar acentuando. [00:09:44] Speaker A: Fica muito claro, então, que para avaliar o valor desses programas genômicos, a gente precisa de um olhar muito mais amplo. Não dá para focar só no potencial científico. Tem que integrar o social, o econômico, o clínico, o populacional. Tudo junto. [00:10:00] Speaker B: Exatamente. E a mensagem forte que fica é a evidência de benefícios amplos e principalmente distribuídos de forma justa ainda é limitada. Isso obriga a gente a pensar muito bem sobre como priorizar os recursos públicos em saúde. O que pesa mais? A promessa tecnológica ou as necessidades de saúde mais imediatas e comprovadas? Uma reflexão importante para o futuro. [00:10:28] Speaker A: Este episódio foi baseado em um artigo de acesso aberto sobre a licença CCBI 4.0. Você pode encontrar um link direto para o artigo e a licença na descrição do episódio. Se achou esta análise valiosa, avalie com cinco estrelas no seu app de podcasts favorito e torne-se membro para receber os episódios antes de todo mundo. Acompanhe também a versão em inglês deste podcast, o Base by Base. Obrigado por ouvir e até o próximo Base por Base.

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