Episode Transcript
[00:00:14] Speaker A: Bem-vindo ao Base por Base, o podcast que leva descobertas genômicas aonde você estiver. Olha só que dado impactante pra começar. A gente conhece umas 7 mil doenças raras, né? Mas assim, menos de 5% delas tem algum tratamento que realmente consiga modificar o curso da doença.
[00:00:30] Speaker B: É muita gente. milhões de pessoas que convivem com condições genéticas sem uma terapia específica para elas. É um desafio enorme.
[00:00:38] Speaker A: Exato. E aí fica aquela pergunta, né? E se a gente pudesse criar tratamentos genéticos tipo quase sob medida, mirando direto na variação genética daquela pessoa?
[00:00:47] Speaker B: Soa como um futuro, né? Mas é uma fronteira que a gente já está explorando. A questão é, como é que a gente sabe quais variações genéticas são de fato bons alvos para essas terapias tão novas? Tipo, como a gente transforma essa promessa em algo real, seguro, eficaz?
[00:01:04] Speaker A: Essa é a questão central mesmo, e é aí que entra o trabalho fundamental que a gente vai discutir hoje. É um esforço do N1 Collaborative, que a gente pronuncia N1C Collaborative, né?
[00:01:16] Speaker B: Isso, N1C Collaborative, uma iniciativa global com um monte de avaliadores voluntários do mundo todo.
[00:01:23] Speaker A: E o que eles fizeram essencialmente... Então.
[00:01:26] Speaker B: Eles encareram de frente essa complexidade toda. Buscaram entender como identificar melhor os pacientes que poderiam se beneficiar dessas terapias genéticas mais individualizadas, sabe? E o foco foi numa classe específica de moléculas bem promissoras, os chamados oligonucleotídeos antisensos.
[00:01:45] Speaker A: Certo, oligonucleotídeos antissenso. Antes de mergulhar nisso, vamos dar um contexto rápido. A maioria das doenças raras, a gente sabe, tem origem genética.
[00:01:56] Speaker B: Sim, e com os avanços no diagnóstico, a gente identifica cada vez mais variantes genéticas. O problema é que desenvolver tratamento para cada uma delas, especialmente para aquelas ultra raras, é um gargalo gigantesco. Falta, é, falta escala, falta um padrão.
[00:02:13] Speaker A: E aí esses oligonucleotídeos antisenso entram como uma possibilidade.
[00:02:18] Speaker B: Exatamente. Pensa neles como, sei lá, uma caixa de ferramentas molecular super versátil. São moléculas que a gente consegue desenhar para interagir com o RNA mensageiro, aquela cópia de trabalho do DNA, de formas bem específicas.
[00:02:34] Speaker A: Ah, interessante. E que tipo de ferramenta tem nessa caixa?
[00:02:38] Speaker B: Olha, tem várias. Algumas conseguem corrigir erros que acontecem no processamento do RNA, o tal do splicing, sabe?
[00:02:45] Speaker A: Sei, a montagem da mensagem genética.
[00:02:48] Speaker B: Isso. Outras podem fazer a célula meio que pular um pedaço defeituoso da instrução genética, o chamado salto de Ekson.
[00:02:56] Speaker A: Pular um erro? Entendi.
[00:02:58] Speaker B: Tem também as que diminuem a produção de genes que estão gerando alguma proteína tóxica. É o knockdown. E tem até estratégias sendo estudadas para, quem sabe, aumentar a produção da cópia normal do gene, o alelo selvagem.
[00:03:12] Speaker A: Nossa, é bem versátil mesmo. Mas imagino que aí vem o desafio que você mencionou.
[00:03:18] Speaker B: Exato! Nem toda a variação genética vai funcionar com essas abordagens. Não é uma solução mágica para tudo. Precisávamos muito de um método, sabe? Um concesso global para avaliar e dizer, ok, essa variante aqui parece um bom alvo para um oligonucleotídeo antisenso. Como é que a gente separa o que tem potencial do que não tem?
[00:03:38] Speaker A: E foi para isso que criaram as diretrizes.
[00:03:41] Speaker B: Precisamente. São as diretrizes NSEVIA. A sigla vem de Variant Assessment Toward Eligibility for Antisense Oligonucleotídeo Treatment. Foi um esforço colaborativo bem grande.
[00:03:54] Speaker A: Quem estava envolvido?
[00:03:55] Speaker B: Instituições de peso como a SickKids, lá de Toronto, o Boston Children's Hospital, o Centro DCRT, na Holanda, em Leiden, e o Instituto Hert, na Alemanha, em Tübingen.
[00:04:05] Speaker A: Uau, um time internacional!
[00:04:08] Speaker B: Sim, e o processo foi super cuidadoso. Fizeram rascunhos, aí testaram na prática com avaliadores voluntários, pesquisadores, geneticistas clínicos, conselheiros genéticos.
[00:04:18] Speaker A: E foram ajustando com base no que eles diziam?
[00:04:20] Speaker B: Isso, feedback foi fundamental para refinar tudo. Foi tipo construir esse consenso passo a passo, sabe?
[00:04:26] Speaker A: Legal. E eles fizeram mais alguma coisa para ajudar na aplicação disso?
[00:04:31] Speaker B: Fizeram sim. Criaram também recursos de apoio bem práticos. Tem uma calculadora online interativa para ajudar na avaliação da elegibilidade da variante.
[00:04:39] Speaker A: Ah, que ótimo!
[00:04:40] Speaker B: E vídeos de treinamento com exemplos práticos e tal. Isso ajuda muito a trazer as diretrizes para o dia a dia dos laboratórios e das clínicas.
[00:04:48] Speaker A: Faz toda a diferença ter essas ferramentas. E qual é o foco principal dessas diretrizes, então, que elas avaliam exatamente?
[00:04:55] Speaker B: O objetivo central é dar um framework, uma estrutura padronizada, uma linguagem comum para avaliar se variantes genéticas que causam doenças são candidatas para as abordagens mais estabelecidas com oligonucleotídeos antisenso. que seriam a correção de splicing, o salto de exon canônico e o silenciamento do RNA mensageiro, o chamado RNA knockdown, que aliás pode ser feito também com uma tecnologia parecida, o pequeno RNA de interferência ou SIRNA.
[00:05:30] Speaker A: Entendi. E como eles fazem essa avaliação na prática? Tem tipo uma nota, uma classificação?
[00:05:36] Speaker B: Exatamente. É um sistema de classificação com cinco níveis para cada abordagem daquelas que falei.
[00:05:42] Speaker A: Cinco níveis. Quais são?
[00:05:44] Speaker B: Bom, vai desde elegível, que é quando já tem evidência funcional, prova concreta de que funciona para aquela variante específica.
[00:05:52] Speaker A: O cenário ideal.
[00:05:54] Speaker B: É. Aí tem provavelmente elegível, quando os critérios moleculares são favoráveis, mas ainda não tem aquela prova funcional direta.
Depois vem improvavelmente elegível, que é quando os critérios moleculares não ajudam muito, mas também não tem prova de que não funciona.
[00:06:10] Speaker A: Entendi, uma zona mais cinzenta.
[00:06:12] Speaker B: Isso. Aí tem não elegível, quando já se sabe que não funciona ou tem alguma característica molecular que impede mesmo. E por fim, incapaz de avaliar, se falta informação ou a abordagem simplesmente não se aplica àquele caso.
[00:06:27] Speaker A: Bem completo o sistema. Ajuda a organizar, né?
[00:06:30] Speaker B: Muito. Ajuda a direcionar a pesquisa, os esforços. E eles já estão até olhando pra frente, sabe? Começando a abordar como avaliar estratégias mais novas, como aquela de aumentar a expressão do gene normal, embora ainda não tenha uma classificação formal pra isso.
[00:06:44] Speaker A: Isso é muito importante. Então, o grande salto aqui é essa padronização, essa linguagem comum entre pesquisadores e clínicos do mundo todo.
[00:06:53] Speaker B: Sem dúvida. Ter todo mundo, de diferentes centros, usando os mesmos critérios para avaliar a elegibilidade de uma variante para terapia com oligonucleotídeo antisenso é um avanço enorme. Ajuda a priorizar, a focar recursos onde tem mais chance de dar certo.
[00:07:10] Speaker A: Mas é importante lembrar, né? Essa é só a primeira etapa.
[00:07:13] Speaker B: Fundamental lembrar disso. A avaliação da variante, essa classificação, é só o primeiro filtro molecular. A decisão de tratar um paciente envolve muito mais coisa.
[00:07:25] Speaker A: Como o que, por exemplo?
[00:07:26] Speaker B: A condição específica daquele indivíduo, o estágio da doença, os sintomas que ele tem, quais são os objetivos do tratamento para ele. Tudo isso está fora do escopo dessas diretrizes, que focam só na variante genética em si.
[00:07:40] Speaker A: Faz sentido. É uma peça do quebra-cabeça, não o quebra-cabeça inteiro. E imagino que, como é um campo que muda tão rápido...
[00:07:48] Speaker B: É. A tecnologia de oligonucleótidos anti-senso está evoluindo muito depressa. Por isso, essas diretrizes não são escritas em pedra.
[00:07:57] Speaker A: Elas vão precisar ser atualizadas.
[00:07:59] Speaker B: Com certeza. O plano, inclusive, é fazer uma revisão anual para garantir que elas continuem refletindo o conhecimento mais atual e continuem sendo úteis na prática.
[00:08:09] Speaker A: Ótimo. Então, para a gente resumir a mensagem principal.
[00:08:12] Speaker B: Em resumo, as diretrizes N1C Variants oferecem uma ferramenta padronizada, essencial. Elas nos ajudam a dar aquele primeiro passo crítico, identificar e priorizar as variantes genéticas que são de fato boas candidatas a serem alvo das terapias com oligonucleótidos antisenso.
[00:08:33] Speaker A: Isso representa, sem dúvida, um passo super importante para tornar a promessa da medicina genética individualizada uma realidade mais palpável para mais pessoas que vivem com doenças raras.
[00:08:44] Speaker B: Exato. E fica aí a reflexão, né? O que essa padronização logo no começo dessa jornada de desenvolvimento terapêutico pode realmente significar para a gente acelerar não só a criação, mas também o acesso mais justo, mais equitativo a essas terapias genéticas individuais no futuro próximo.
[00:09:02] Speaker A: Este episódio foi baseado em um artigo de acesso aberto sobre a licença CCBI 4.0. Você pode encontrar um link direto para o artigo e a licença na descrição do episódio. Se achou esta análise valiosa, avalie com 5 estrelas no seu app de podcasts favorito e torne-se membro para receber os episódios antes de todo mundo. Acompanhe também a versão em inglês deste podcast, o Base by Base. Obrigada por ouvir e até o próximo Base por Base.